Renato da Matta se livrou da Covid-19 duas vezes. O feito é visto com bom humor pelo ativista que hoje também atua na Secretaria Municipal do Rio de Janeiro como consultor sobre HIV/aids.
A perseverança com que Renato enxerga os desafios que vive foi adquirido por meio de anos lutando para continuar vivo, após receber o diagnóstico de HIV, mas principalmente devido a seu exercício diário em ajudar pessoas que também vivem com o vírus e que se encontram e situação de vulnerabilidade social.
Na soma ao HIV, vírus que Renato afirma não se lhe causar preocupações, o consultor é, como ele mesmo se denomina, “um fumante inveterado”.
Na primeira infecção por Covid, Renato mal sabia do que se tratava. Isso porque ela chegou em seu corpo em fevereiro de 2020, um mês antes de o Brasil de fato começar a sentir o impacto da pandemia.
O primeiro contato com a infecção lhe deixou frágil. Sentiu dores no peito, ficou com o nariz congestionado e demorou ao menos 10 dias após a infecção para sentir que seu pulmão começava a se recuperar.
Nesse período, ele se lembra de que sequer havia disponibilidade de testes rápidos para serem feitos.
Rotina na pandemia
Justamente nesse mesmo período, Renato vivia a alegria do nascimento da filha, em fevereiro de 2020.
“Foi muito preocupante ainda mais para as mulheres puérperas. Imagine o cenário, você ter uma pandemia letal, sem tratamento, você se desespera.”
Ainda assim, Renato não parou as atividades no hospital de referência em tratamento para o HIV no município, o Hospital Universitário Gaffrée e Guinle.
“Eu ia trabalhar com documento dizendo que eu podia transitar, por trabalhar em área de saúde. Parecia cenário de filme depois do fim do mundo, era uma situação ate deprimida. Eu entrava nos ônibus, e tudo vazio. A gente passou a ver pessoas próximas a nós morrerem. Então fiquei pensando se iria sobreviver a isso tudo, pensei muito na minha família, as pessoas que eu amo”, lembra.
“Perdi muitos amigos. Foi uma época de muitas incertezas, também na questão politica, porque você não via uma diretriz do governo. E então pensei, se o governo está desse jeito, como fica a gente aqui na ponta?”
Para aumentar a angústia de Renato, a organização social para a qual ele trabalhava alocado dentro do hospital de referência fechou as portas e “simplesmente sumiu”, como ele conta. “Colocaram outra empresa no lugar e sumiram sem pagar os funcionários, incluindo eu”. Renato segue esperando a resolução na justiça.
Nesse período, sua filha estava com apenas quatro meses e Renato contou com a ajuda de amigos, e familiares e a gratidão em forma de auxílio de pessoas que haviam se beneficiado com a lei que leva seu nome (conheça mais detalhes da lei aqui). “Foi um ‘Deus nos acuda’”.
Com as eleições municipais, que aconteceram ainda no ano de 2020, Renato recebeu o convite para trabalhar na Secretaria de Saúde como consultor sobre HIV/aids. “Sou usuário do sistema, já trabalhei na rede pública e sei onde estão os gargalos. Então entrei justamente para ajudar nisso.”
Governo gerou insegurança
Renato também lembrou das insegurança trazidas pelas sucessivas trocas de ministros da saúde. “Tivemos inclusive o Pazuello, um ministro que não entendia nada sobre saúde. Tiveram os episódios de Manaus, onde pessoas morreram sem oxigênio. Nessas horas você tem dimensão da pandemia e da incompetência do governo. E como administrar isso? Foi muito complicado principalmente para os menos favorecidos.”
O consultor também acompanhou de perto a perda de empregos de pessoas próximas e citou a situação econômica do país como um agravante. “Vi perda de empregos, um aumento absurdo da inflação, gás gasolina, cesta básica. A população brasileira foi massacrada, não só pela pandemia, mas pelo governo. As pessoas perderam a renda e não recuperaram. O país está naufragado. As pessoas de média e baixa renda estão sofrendo até hoje.”
“O sofrimento da população com governadores roubando em cima da saúde das pessoas. Isso é genocídio. Um crime contra a humanidade, porque quando você rouba da saúde, você mata na ponta”, defende.
Segunda infeção por Covid
Segundo Renato, o milagre foi operado novamente durante a recente infecção pela Covid. Dessa vez, o vírus não poupou também sua esposa, que inicialmente achou que se trataria apenas de uma rinite, e a filha que agora tem dois anos.
Apesar de ter escapado de um caso mais grave da primeira vez, Renato atribui a ausência de sintomas que sentiu agora à vacinação. “É quase um milagre, já fui internado com efizema pulmonar. E consegui vencer a Covid.”
Sua esposa ainda busca se recuperar dos sintomas que surgiram e do cansaço que ainda persiste. A filha pequena também segue com a tosse, mas já bem melhor de saúde.
“Na hora, fico chateado, com raiva. Deixo o sentimento vir, às vezes explodo comigo mesmo. Depois consigo encarar sem ficar remoendo.”
Diante desse cenário e de todas as experiências de vida que o trouxeram aqui, Renato sabe que é um sobrevivente. “Passei por epidemia de meningite, a de HIV, agora as infecções por Covid e já sobrevivi até a quedas de avião quanto atuei como militar”, lembra Renato com bom humor.
“Imagina se no começo da pandemia fosse uma cepa com o poder de transmissão da ômicron? Teria dizimado a terra”, diz ao lembrar da força que a vacina representa para a saúde pública.
“Li poucos relatos de pessoas soropositvas que morreram em decorrência da Covid-19. Isso com certeza é resultado da vacina.”
Renato, agora recuperado, segue trabalhando em seus sonhos para melhorar a qualidade de vida das pessoas com HIV de seu município. “As coisas não acontecem com a velocidade que gostaríamos, mas espero ainda esse ano trazer melhorias para essa população”, diz otimista.
Fonte - Agencia de Noticias da Aids
https://agenciaaids.com.br/noticia/apos-contrair-covid-19-por-duas-vezes-renato-da-matta-segue-confiante-na-ciencia-na-vacina-e-no-sus/